O ponto de partida
A ideia de uma viagem de bicicleta surgiu há uns 10 anos. Já tinha ouvido falar muito sobre viajantes, acompanhava a cultura “hippie” e esse tema sempre me chamou atenção. Afinal, quem não gosta da ideia de viver por aí, viajando, curtindo a vida, vivendo das artes e conhecendo coisas novas? Pois é, eu também queria.
Por volta dos meus 18 anos, comecei a produzir colares de miçangas e pulseiras. Eram pequenos ensaios para entrar nessa vida de viajante. Já aos 25, meu plano era me mudar para a Europa e tentar a vida por lá.
Mas os planos mudaram. Depois de uma série de acontecimentos incontroláveis, decidi que iria viajar de bicicleta. Nesse momento eu já conhecia a vida dos viajantes do YouTube — aqueles “malucos” que atravessavam países caminhando ou pedalando, pedindo carona, acampando no mato, dormindo em postos de gasolina e simplesmente vivendo.
O que me motivou
A busca por liberdade e a necessidade de me conhecer foram o pivô da minha motivação. Eu estava cheio de sonhos e com a sensação de que a vida que eu levava não fazia sentido a longo prazo.
Mudar depois de 25 anos vivendo do mesmo jeito parecia impossível. Você já tentou mudar um velho hábito e percebeu que ele parece mais forte do que você? É quase como tentar mover um elefante com as próprias mãos. Precisa de força, mas também de coragem.
Eu tinha a força motivacional. A coragem… essa faltava. No fim, fui sem coragem mesmo.
Um momento marcante
Lembro bem do meu aniversário de 25 anos. Decidi acampar em uma praia a 40 km de casa — Camping da Wandinha, na Praia de Calhetas, Recife.
Durante essa experiência conheci outras pessoas que também viajavam sozinhas. Compartilhamos histórias, vivemos juntos as experiências do lugar. Foram três dias de muita troca e conexão. Naquele momento, entendi que era possível sair de casa sem planos e, ainda assim, viver algo extraordinário.
Preparação e primeiras pedaladas
A montagem da bicicleta foi feita aos poucos. Eu tinha uma ideia do que precisava, mas só descobri o que era realmente necessário nas primeiras viagens.
O bagageiro foi a primeira adaptação, desenhado por mim e construído pelo pai da minha ex-namorada, um ferreiro incrível. Com ele, pude instalar os alforges — bolsas laterais que se conectam ao bagageiro.
Depois vieram as outras mudanças: um selim mais confortável, guidão borboleta, acessórios de iluminação e sinalização. Por fim, comprei meus primeiros alforges no AliExpress. Simples e baratos. Assim estava pronto para as primeiras viagens.
A sensação do primeiro dia
Minha viagem começou rumo ao Vale do Catimbau, em Buíque-PE, a cerca de 300 km de onde eu morava.
No primeiro dia, a sensação era elétrica, como se todo meu corpo estivesse tomado por energia. Ao começar a pedalar, senti uma estranheza: como se eu tivesse me desconectado de todos e, ao mesmo tempo, conectado a tudo.
“Eu sou um cicloviajante”, pensei. “Essa é a minha aventura.”
O que passava na minha cabeça
Incerteza. Esse foi o sentimento mais presente nos primeiros momentos. O medo estava ali, mas em cima da bike ele já não me assustava.
A ansiedade desaparecia a cada giro do pedal da Kurama — minha bicicleta. Eu estava feliz, empolgado, com a certeza de que aquela era a aventura da minha vida.
Expectativas vs. realidade
Antes da viagem, eu tinha muitas expectativas. Sempre fui de pensar e planejar muito antes de dar um passo. Minha dica? Planeje bem, mesmo sabendo que as coisas nunca vão sair exatamente como o planejado.
E de fato não saíram. A alimentação, o tempo de pedal e os lugares para dormir estavam dentro do previsto: cozinhei na estrada, dormi em postos de gasolina e pedalei três dias até o Vale do Catimbau.
Mas a estrada sempre surpreende.
No segundo dia, por exemplo, preparei meu almoço debaixo de um viaduto. Tinha pedalado bastante, passei por uma cidadezinha e acabei comprando um quilo de peito de frango. Cozinhei tudo ali mesmo, debaixo da ponte. Nunca imaginei que faria isso.
Também enfrentei recusas nos primeiros pedidos para dormir em postos de gasolina. Foi duro no começo. Mas fazia parte.
Surpresas boas
Chegando ao Vale, me deparei com uma cidade mais viva do que eu imaginava: mercadinhos, padarias, lojas e muita gente na rua. No camping, encontrei várias pessoas que tinham ido para trilhas e aventuras.
Uma surpresa ainda maior foi a generosidade das pessoas. A bicicleta chamava atenção e sempre rendia conversas. Eu era “o cara que chegou de bicicleta”. Isso me deu um certo holofote que eu não queria, mas foi uma experiência enriquecedora.
No Catimbau, conheci um casal incrível. Fizemos trilhas juntos e criamos uma amizade forte. Descobri que moravam na mesma cidade que eu. Dias depois, recebi um convite inesperado: voltar com eles para Recife de carro.
No começo resisti, mas aceitei. Não queria pedalar mais três dias no mesmo caminho. Voltamos juntos em um dia chuvoso, trocando histórias, parando para almoçar. Foi uma volta cheia de vida. E assim, a estrada me deu um amigo.
Aprendizados iniciais
A bicicleta me ensinou que, quando desaceleramos, damos espaço para a vida se mostrar. E quando a vida se mostra, precisamos estar atentos para vivê-la.
Aprendi que, ao me desafiar, era eu mesmo acreditando na minha força. A estrada é longa, mas quem a escreveu foi Deus. Nós, como parte de tudo, somos capazes de cruzá-la com nossa própria energia.
O sentido da viagem
Essa viagem foi o primeiro passo para eu me tornar quem sempre sonhei ser: mais corajoso, mais forte, mais conectado.
Ela me mostrou novos gostos, novas histórias e novos caminhos para encontrar o sentido de viver.
Para mim, viver é estar fazendo o que gosto. Viver na estrada significa entender que eu sou a própria estrada — e que ela me leva sempre a mim mesmo.
Essa foi a forma como tudo começou. Aqui no blog vou compartilhar não apenas rotas e destinos, mas também aprendizados, encontros e reflexões que a estrada me oferece.
Se quiser viajar comigo, é só seguir lendo. A estrada é longa, e está só começando. 🚴✨